Lago da represa da hidrelétrica de Marimbondo praticamente seca, na região entre as cidade de Icem e Guaraci, interior de São Paulo — Foto: Joel Silva / Fotoarena / Agência O Globo)

 Os impactos da seca e das queimadas estão em todas as áreas e a economia sente também o efeito. No caso das secas, evidentemente, há reflexo no preço de alimentos que, nos últimos dois meses, registrou queda e contribuiu para a redução da inflação. No mês de agosto, no IPCA, a alimentação no domicílio teve uma redução de 0,73%, depois de já ter registrado uma queda forte em julho.

Em todos os outros índices que a gente acompanha, como o IPC da Fundação Getulio Vargas, o item alimentos caiu. E agora, com a seca e as queimadas, muitas lavouras serão afetadas. O ministro Fernando Haddad admitiu ontem que esse é um ponto que preocupa, e admitiu que a inflação deve subir. E, como Haddad destacou, a seca afeta também a energia. A seca dos rios amazônicos tem reflexo na energia fornecida por hidrelétricas, que é mais barata, a oferta diminui, o que acaba levando ao uso de fontes mais caras e poluentes, retroalimentando o problema ambiental causado também pela fumaça das queimadas.

O professor Paulo Saldiva, da USP, que é um grande especialista em qualidade do ar, em conversa com Ana Carolina Diniz, aqui do blog, disse que as queimadas vão aumentar as doenças crônicas respiratórias e isso vai ter efeito para os próximos anos. Isso deixa claro que há impacto em todas as áreas. No caso dos alimentos, alguns itens devem ser mais atingidos do que outros, isso vai depender se a colheita já foi feita, por exemplo. Hortaliças serão afetadas certamente e a feira do dia a dia ficará mais cara, pelas queimadas e pelo calor excessivo em pleno inverno.

Todos esses fatores devem aumentar a inflação, o que amplia a expectativa de como tudo isso se refletirá na decisão do Copom sobre a taxa de juros na reunião que acontece na terça e quarta-feira da próxima semana.

O ministro Haddad disse que essa crise em si não é uma razão para subir os juros, isto porque, explica, não é uma inflação que vem da demanda, mas de um evento que tende a se dissipar mais adiante. Esse argumento não convencerá o Banco Central. Tudo leva a crer que haverá um aumento de taxa de juros. Há uma pressão constante do mercado para que o BC vá nessa direção, como se a autoridade monetária tivesse que provar que é independente, diante da proximidade da mudança na presidência.

Mas o fato é que com a inflação muito perto do teto da meta, uma das possibilidades realmente é elevar a taxa de juros. Manter a inflação na meta é o mandato do Banco Central. Por isso o BC fala da política fiscal, de outros fatores inflacionários.

Na última entrevista que eu fiz com o Roberto Campos Neto, o questionei sobre se a mudança climática, como tudo que afeta preços, estava no mandato do Banco Central, e ele disse que sim. Campos Neto disse que o Banco Central tinha que se preocupar com essa temática e que isso significa não apenas regular juros, mas que a autoridade monetária pode induzir os bancos a investirem em atividades que não afetam de forma danosa o meio ambiente, em empresas que não estão desmatando.

Campos Neto diz que há toda uma agenda da autoridade monetária, como regulador do mercado financeiro, de induzir boas práticas na produção econômica para não agravar a mudança climática.


Fonte: O GLOBO