Candidatos direcionam foco para o segmento religioso neste início de campanha, após pesquisa recente mostrar queda dentro da margem de erro do prefeito nesse grupo

Nunes na Marcha para Jesus, realizada em maio; Boulos participou nesta segunda de um encontro com evangélicos na Barra Funda — Foto: Maria Isabel Oliveira/30-5-2024 e Reprodução/Instagram

 Em busca dos votos dos evangélicos e católicos, os candidatos à prefeitura de São Paulo têm feito “maratona” em igrejas, marcado encontro com lideranças evangélicas e exaltado a fé em vídeos e publicações nas redes sociais.

Segundo pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira, Pablo Marçal (PRTB) tem 30% de intenção de voto entre os evangélicos contra os 18% que marcava na pesquisa anterior. Ricardo Nunes (MDB) soma 22% de intenções de votos nesse segmento — no início do mês, a taxa era de 26%, uma queda dentro da margem de erro, que para essa análise é de seis pontos percentuais. Assim, os dois estão tecnicamente empatados. José Luiz Datena (PSDB) aparece com 14%, seguido por Guilherme Boulos (PSOL) com 12%.

Intenção de voto para prefeito de São Paulo — Foto: Editoria de Arte

O atual prefeito é quem mais tem feito agendas com religiosos, algo que vem sendo construído desde o ano passado tanto em pautas mais institucionais, relacionadas à gestão, quanto nas políticas. Nunes é católico e nunca escondeu isso, mas é bem relacionado com lideranças evangélicas. Em maio, participou da Marcha para Jesus. No último domingo, esteve em cultos da Assembleia de Deus Belém e da Igreja Unida Deus Proverá, e tem pastores e bispos como aliados.

Sempre perto

Segundo um integrante da campanha, a preocupação em se manter próximo a esse eleitorado “é constante” e nada é garantido, e por isso Nunes segue de olho em se aproximar desse público sempre que possível. O prefeito tenta ser sutil, não costuma discursar nas igrejas — a legislação proíbe campanha em templos religiosos—, mas tenta permanecer próximo. Ele sempre exalta, por exemplo, que a tarifa zero no transporte aos domingos permite que as pessoas frequentem mais os cultos e as missas.

Nunes estreou sua campanha na Catedral de Santo Amaro, na Zona Sul, seu reduto eleitoral e onde é frequentador há anos. Lá, recebeu uma oração do bispo Dom José Negri. No dia anterior o emedebista já havia participado de uma missa no Pacaembu, Zona Oeste. No sábado, Nunes foi ao Santuário Mãe de Deus, em Interlagos, a igreja do padre Marcelo Rossi.

E no domingo, foi a vez de visitas a congregações evangélicas na região do Brás e do Belenzinho, bairros que abrigam dezenas de igrejas neopentecostais uma ao lado da outra. Na Igreja Unida Deus Proverá, o bispo Luciano Neves disse que o prefeito “faz o bem” e puxou aplausos, que foram repetidos pelos fiéis. Depois, Nunes foi à Assembleia de Deus Belém, no Belenzinho, onde recebeu uma oração e uma breve apresentação do pastor Adauto Silva, que destacou que a Igreja é “a favor da vida e contra as drogas”.

Já para os candidatos mais atrelados à esquerda, avançar no segmento religioso é um desafio maior — tanto é que no início do mês, a Fundação Perseu Abramo, braço teórico do PT, elaborou uma cartilha para orientar o diálogo de candidatos do partido com evangélicos na eleição municipal deste ano. Há meses, Guilherme Boulos (PSOL) tenta moderar o discurso para angariar uma parcela dos evangélicos: diz em entrevistas que sua família é da Igreja Cristã Ortodoxa, nega ser a favor da legalização das drogas e diz que, sobre o aborto, defende a legislação vigente.

Busca por diálogo

Na segunda-feira, Boulos participou de um encontro com evangélicos de igrejas como Universal, Assembleia de Deus e Avivamento, na Barra Funda, Zona Oeste de São Paulo. O candidato pediu ajuda contra “falsos profetas” e no combate a notícias falsas.

Boulos se comprometeu com temas como alfabetização, combate à fome e moradia, e recebeu uma carta de representantes do grupo, que se disse “aberto às parcerias legalmente possíveis com o governo em prol da Justiça”. O psolista seguiu um movimento iniciado ainda na pré-campanha, em que busca dialogar principalmente com representantes de pequenas congregações nas periferias, já que as lideranças de grandes igrejas costumam ser mais ligadas a políticos de direita.

Tabata Amaral (PSB), por sua vez, sempre que possível destaca que cresceu frequentando a igreja católica e um dos capítulos de sua minissérie no YouTube, na qual se apresenta ao eleitor, é intitulado “Fé”. No vídeo, a candidata destaca o papel das igrejas para as comunidades, aparece rezando, e se dirige também às igrejas evangélicas e às religiões de matriz africana, pois segundo ela todas as religiões “preenchem um vazio” nas periferias, sendo lugares de encontro e comunhão nas comunidades.

Ainda tentando reduzir obstáculos entre esse público, Tabata costuma ponderar que, apesar de ser formada em astrofísica, suas visões sobre ciência não contrastam com a crença em Deus. Em entrevista ao Roda Viva na última segunda-feira, por exemplo, defendeu as comunidades terapêuticas e o papel da fé no tratamento da dependência química. No visual, também reforçou o uso de um colar com a pomba do Espírito Santo nas aparições públicas.

Datena, por sua vez, começou a campanha agradecendo a Deus, destacando sua relação com o catolicismo: foi até o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, que fica a cerca de 170 quilômetros da capital paulista. Lá, orou, falou com simpatizantes e recebeu uma medalha de Nossa Senhora de presente de uma vendedora local.

O rápido crescimento de Marçal no segmento evangélico acompanha o avanço dele entre os eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), onde foi de 29% para 44%, ante a queda de 38% para 30% de Nunes. O influenciador sempre se disse cristão. Religião, Deus, Bíblia e valores tradicionais da família são uma constante em seus discursos, postagens nas redes sociais, palestras e cursos, há anos. Os cursos e mentorias que ele vende ensinando como ficar rico e como prosperar são sempre associados a Deus, e ele tem diversos cursos explorando a espiritualidade e a religião.

Marçal também tem em seu histórico profissional cargos de liderança na Igreja Videira, que tem várias unidades em Goiânia. O influenciador foi uma espécie de “pupilo” do pastor Aluízio Silva, líder da congregação. Mas se Marçal alcança a base com seus discursos, entre representantes de grandes igrejas enfrenta resistências: o pastor Silas Malafaia, por exemplo, rechaçou a possível participação do ex-coach ao ato de Sete de Setembro, convocado por ele para protestar contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).


Fonte: O GLOBO